Aluno:
Pedro Manuel Ramos Moreira
Número
de aluno: 1501253
Unidade
Curricular: Seminário de Prática Pedagógica[11058]
Curso:
Curso de Profissionalização em Serviço [1117]
Data:
13 de abril de 2016
Introdução
A
disciplina de língua materna tem um papel fulcral no sistema educativo.
Assumindo os nomes de Língua Portuguesa ou de Português, consoante o nível de
escolaridade, tem a particularidade de ser, de entre todas as disciplinas, a
única presente em todos os anos de escolaridade, independentemente de se tratar
de ensino regular ou profissional, o que é sintomático da sua importância. No
já revogado Currículo Nacional do Ensino Básico (Departamento da Educação
Básica [DEB], 2001, p. 31) dizia-se que esta disciplina “desempenha um papel
fundamental no desenvolvimento das competências gerais de transversalidade
disciplinar” (DEB, 2001, p. 31) por ser a língua de escolarização e a língua
materna da grande maioria da população escolar, “um veículo decisivo na
construção dos saberes das outras áreas disciplinares” (Buescu, Morais, Rocha e
Magalhães, 2015, p. 19) pelo que “o domínio da língua portuguesa é decisivo no
desenvolvimento individual, no acesso ao conhecimento, no relacionamento
social, no sucesso escolar e profissional e no exercício pleno da cidadania.”
(DEB, 2001, p. 31)
A didática da língua materna – especificidade
De
acordo com Reis e Adragão (1989), a didática da língua materna ocupa um lugar
muito específico no ensino, em particular na relação que se estabelece entre o
professor e os alunos, uma vez que o que é ensinado não é desconhecido dos
alunos, também falantes nativos da mesma língua, que a dominam em diferentes
graus de proficiência, mas que a dominam. O professor apenas transmite algo
desconhecido dos alunos quando fala da gramática, da história da língua, da
literatura, das técnicas de análise de texto, sendo que no restante trabalho
realizado em aula há uma intersecção entre o que professor e alunos conhecem.
Assim, o desenvolvimento da competência linguística, sociolinguística e
pragmática, concorrem para o desenvolvimento da competência comunicativa dos
alunos, que poderá ser o essencial e o mais importante na aula de língua
materna. No entanto, os alunos estão permanentemente expostos ao uso da língua
portuguesa, usando-a eles próprios, em todos os contextos do seu dia-a-dia,
pelo que o ensino de uma ferramenta tão conhecida de todos é necessariamente
diferente do ensino de qualquer outra disciplina. Partindo de alguns exemplos do dia-a-dia, o vídeo seguinte aborda o estudo da gramática.
A didática da língua materna – princípios metodológicos
Reis
e Adragão (1989,p. 15) defendem que “o aprendente é mais importante que a matéria
que se ensina.” O aluno deve ser o centro do processo de ensino e aprendizagem.
Cada aluno tem as suas próprias competências e necessidades específicas de
aprendizagem, individuais, diferentes mesmo das do resto da sua turma. Cada
aluno tem o seu progresso e a sua forma de se apropriar de cada item, pelo que
o professor deve adaptar e individualizar a sua prática a cada um dos alunos,
tendo em conta as suas especificidades, graus de proficiência no domínio da
língua, interesses pessoais, perspetivas para o futuro, como no pequeno exemplo que se segue, do filme Mentes Perigosas, de 1995.
De
acordo com Reis e Adragão (1989), o professor de língua materna deve propor aos
alunos os comportamentos verbais adequados a cada situação, não se limitando à
perspetiva linguística, abarcando também as componentes pragmática e social do
uso da língua, em particular da fala. Mais do que isso, o professor da língua
materna deve dar prioridade ao ensino da língua padrão, mas sem nunca se
esquecer dos diversos registos e níveis da língua. Deve respeitar as produções
dos alunos mas também prepará-los para o uso do registo adequado a cada
situação e interlocutor, novamente numa perspetiva de uso pragmático da língua,
em que a competência comunicativa é a mais importante, ou seja, a competência
linguística e a gramaticalidade de todos os enunciados são fatores desejáveis, mas
não os únicos necessários para uma boa comunicação.
Na
mesma linha de pensamento, o ensino da língua materna deve dar igual
importância à vertente informativa, à interpessoal e à textual, ou seja, os
conteúdos da comunicação, os intervenientes e a forma da comunicação, que devem
ser encarados como sendo, todos eles, como “fundamentais na estruturação de
qualquer execução linguística.” (Reis & Adragão, 1989, p. 16)
Objetivos do ensino do português
Reis
e Adragão (1989) referem no seu texto algumas finalidades do ensino da língua
materna. No entanto, por uma questão de atualização, uma vez que esse texto é
de 1989, vão-se abordar os objetivos do ensino do português presentes em Buescu
et al. (2015, pp. 5-6), no Programa
e metas curriculares de português do ensino básico. São vinte e um objetivos, que se anexam na íntegra:
1. Adquirir e
desenvolver estratégias de escuta ativa com vista a reter informação essencial,
a desenvolver a compreensão, e a produzir enunciados orais em contextos
específicos.
2. Compreender
as diferentes intencionalidades comunicativas nas situações de oralidade e
saber utilizá‐las criticamente, não só no quotidiano
como na produção de discursos em contextos formais, designadamente discursos de
apresentação e discursos de argumentação.
3. Produzir
textos orais em português padrão, segundo categorias e géneros específicos,
complexificando progressivamente as suas diferentes dimensões e
caracterizações.
4. Usar
fluentemente a língua, mobilizando diversos recursos verbais e não‐verbais,
e utilizando de forma oportuna recursos tecnológicos.
5. Adquirir,
interiorizar e automatizar os processos que permitem a decodificação do texto
escrito, com vista a uma leitura individual fluente.
6. Desenvolver e
consolidar a capacidade de leitura de textos escritos, de diferentes géneros e
com diferentes temas e intencionalidades comunicativas.
7. Compreender a
associação entre o código oral e o código escrito, apropriando‐se
das características deste último, de modo a redigir com correção linguística.
8. Desenvolver a
capacidade de adequar formas de escrita a diferentes situações de comunicação e
em contextos específicos, fazendo uso reflexivo das diversas modalidades da
língua.
9. Produzir
textos com objetivos críticos, pessoais e criativos.
10. Produzir
textos escritos de diferentes categorias e géneros, conhecendo e mobilizando as
diferentes etapas da produção textual: planificação, textualização e revisão.
11. Dominar os
procedimentos que asseguram um adequado desenvolvimento textual, temático e
discursivo, com progressiva consolidação do domínio dos géneros escolares,
nomeadamente a exposição e a argumentação.
12. Consolidar
os domínios da leitura e da escrita do português como principal veículo da
construção crítica do conhecimento.
13. Monitorizar,
de formas variadas e regulares, a compreensão e a produção de textos orais e
escritos.
14. Interpretar
textos orais e escritos, de expressão literária e não literária, de modalidades
gradualmente mais complexas.
15. Interpretar
textos literários de diferentes géneros e graus de complexidade, com vista à
construção de um conhecimento sobre a literatura e a cultura portuguesas,
valorizando‐as enquanto património de uma
comunidade.
16. Apreciar
criticamente a dimensão estética dos textos literários, portugueses e
estrangeiros, e o modo como manifestam experiências e valores.
17. Reconhecer a
inscrição da matriz cultural na aprendizagem do Português.
18. Construir um
progressivo domínio do funcionamento da língua, na oralidade e na escrita,
através da capacidade de reflexão sobre as suas regularidades, de modo a ganhar
autonomia no uso dos códigos da mesma.
19. Mobilizar os
conhecimentos gramaticais para aperfeiçoar as capacidades de interpretar e
produzir enunciados orais e escritos.
20. Adquirir um
conhecimento reflexivo sobre a língua e explicitar e sistematizar aspetos
fundamentais da estrutura do português padrão.
21. Compreender
o português padrão e fazer uso adequado dele nas diversas situações de
oralidade, de leitura e de escrita.
Alguns
destes objetivos são semelhantes às finalidades elencadas por Reis e Adragão
(1989, pp. 16-17), que no seu texto destacam, por exemplo: a promoção da
constante procura pela melhoria da competência comunicativa; o desenvolvimento
da capacidade de raciocínio, memória e espirito crítico; a promoção da
identificação do aluno com manifestações culturais nacionais e universais;
promover a autoconfiança, autonomia e realização pessoal. Qualquer uma destas
finalidades se centra no progresso individual do aprendente, pelo que o mesmo
se pode dizer em relação à relação pedagógica. Para além destas, Reis e Adragão
(1989, pp. 16-17) ainda mencionam: “Facultar processos de aprender a aprender e
condições que despertem o gosto pela atualização permanente de conhecimentos”,
que se pode rever na interdisciplinaridade e na aprendizagem ao longo da vida;
“Proporcionar a compreensão de ser a língua portuguesa um património nacional e
fator de ligação entre povos distintos”, tomando-se a língua como património e
como elo de ligação entre os seus falantes, dentro e fora de Portugal;
“Favorecer a interiorização dos princípios universalizantes de justiça,
tolerância, solidariedade e cooperação”, sendo esta a perspetiva ética da
disciplina, apesar de não ser a única em condições para o fazer; e “Assegurar o
desenvolvimento gradual das capacidades de expressão e compreensão em língua
materna” é a primeira finalidade apontada, talvez a mais importante para o
autor do texto, mas não a única, segundo Reis e Adragão (1989). Caberia assim
ao professor articular todas estas finalidades e responder às necessidades
individuais dos alunos da melhor forma possível, o que se pode dizer também em
relação aos objetivos atualmente em vigor, muitos deles correspondentes a estas
ideias, apesar de haver, como já foi mencionado, a condicionante acrescida de
se terem que atingir as Metas Curriculares previstas.
Os conteúdos programáticos
Segundo
Reis e Adragão (1989), o ensino da língua materna pressupõe que se veja o
objeto de estudo como um contínuo que atravessa toda a vida dos aprendentes,
antes mesmo de entrarem para a escola e que continuará mesmo depois de a
terminarem. Não é viável compartimentar o ensino da língua em determinados
segmentos de aprendizagem, de conjuntos de conteúdos e competências a adquirir
ano a ano. Na linha do que vem sendo dito até aqui, cabe ao professor adaptar o
programa que tem em mãos à realidade e necessidades de cada grupo de alunos e,
dentro destes, de cada aluno, individualmente.
No
entanto, os conteúdos programáticos abordados por estes autores encontram-se já
desfasados dos atuais, uma vez que o texto tem vinte e sete anos, pelo que se
abordarão em seguida os conteúdos do programa atualmente em vigor. No caso concreto
do segundo ciclo, Buescu et al., (2015),
no Programa e metas curriculares de português do ensino básico apontam quatro domínios de referência:
Oralidade, Leitura, Escrita, Educação Literária, Gramática. Os documentos
orientadores para o professor de língua materna serão assim este programa e
respetivas metas curriculares, que deverão ser usados em conjunto, de acordo
com as diretrizes do próprio documento: “A interdependência entre Programa e
Metas Curriculares manifesta‐se no facto de a
operacionalização dos conteúdos ser definida nos descritores de desempenho
constantes das Metas Curriculares” (Buescu et al., 2015, p. 3) e os
conteúdos do programa remetem para as Metas Curriculares, onde “estão elencados
objetivos e descritores de desempenho avaliáveis, permitindo que os professores
se concentrem no que é essencial e ajudando a delinear as melhores estratégias
de ensino” (Buescu et al., 2015, p.3). Ou seja, cabe ainda ao professor
de língua materna gerir da melhor forma possível o programa que tem em mãos,
tal como Adragão e Reis (1989) sugerem, mas tendo em conta as metas a atingir,
pois é-lhes exigido que cumpram as metas curriculares e que avaliem o
desempenho dos alunos em cada ponto do programa: “os descritores de desempenho
dos diferentes objetivos foram selecionados e elaborados no sentido de
permitirem que cada um deles seja objeto de ensino explícito e formal” (Buescu et
al., 2015, p.3).
Passando concretamente à caracterização dos conteúdos de Língua
Portuguesa do segundo ciclo presentes em Buescu et al., (2015, pp.
19-20), tal como já foi dito anteriormente, estes encontram-se separados em
quatro domínios: Oralidade, Leitura e Escrita, Educação Literária e Gramática.
Quanto à Oralidade, “pretende‐se que os
desempenhos dos alunos revelem o respeito, já constituído como rotina, pelos
princípios de cortesia e de cooperação no plano da interação verbal”, para além
de ganharem maior dimensão e formalidade; para a Leitura e Escrita, associadas
como um só domínio, “considera‐se a pertinência de uma prática que
confirme a automatização das habilidades de identificação das palavras escritas
e do seu uso com correção ortográfica, e da produção escrita de respostas e
pequenos textos”, que deverão ser, progressivamente, mais ricos e complexos; a
Educação Literária, cuja existência como domínio autónomo, desligado da
Leitura, é uma novidade neste novo programa, existe para que “os alunos possam
ir construindo e consolidando a sua capacidade leitora, nomeadamente em torno
dos géneros e textos eleitos, como fábulas, lendas, contos.” Existe alguma
liberdade para a escolha da obra a estudar dentro da lista fornecida, para além
de se complementar este domínio com a leitura autónoma, para a qual se poderão
selecionar obras dentro das listadas no Plano Nacional de Leitura. Por último,
no domínio de Gramática, há lugar para o estudo relativo a fonologia, relações
semânticas entre palavras, morfologia e sintaxe, Realça-se “incide‐se
de uma forma significativa no estudo da morfologia, não apenas no que aos
constituintes da palavra e processos morfológicos de formação de palavras diz
respeito, mas, sobretudo, nos paradigmas flexionais, cuja cabal compreensão
contribui para um uso seguro e adequado da língua”, pois pretende-se que os
alunos “apliquem esse conhecimento fazendo um bom uso do português nas diversas
situações de oralidade, de leitura e de escrita, de forma contextualizada e
crítica.”
Contrariamente a
programas anteriores, agora revogados, em que havia sugestões de gestão do
tempo quanto aos domínios, não há neste programa qualquer referência a esta
gestão. No entanto, e tal como Reis e Adragão (1989, p. 21) referem
relativamente à gestão do tempo, “só sabendo que equilíbrio se pretende ano a
ano e confrontando os resultados do trabalho com as intenções iniciais se
conseguirá uma eficiente auto-avaliação e um progresso na prática letiva”, ou
seja, defende-se que cada professor faça a gestão do tempo em função das
necessidades particulares dos alunos.
Conclusão
Não será difícil
concordar que a disciplina de língua materna, por todas as particularidades
elencadas, possui um papel fulcral dentro de qualquer sistema educativo. No
caso português, a disciplina de Língua Portuguesa reveste-se de especial
importância por ser a língua de escolarização, por ser a língua que transmite o
legado cultural de um povo, por ser a língua que une diversos povos em diversos
continentes e, muito simplesmente, por ser a língua que os alunos usam no seu
dia-a-dia.
Assim sendo, o
papel do professor de Português é também diferente do papel dos professores das
outras disciplinas, por não lhes transmitir conhecimentos sobre algo que desconhecem,
mas por os levar a aprender algo mais sobre a sua própria língua. E nesta
afirmação reside, um pouco disfarçada, a questão primordial apontada por Reis e
Adragão (1989): o principal objetivo do professor de português é levar os
alunos a aprender, de acordo com as suas características, “a finalidade é ensino,
o produto é o sucesso do aluno (no mais amplo dos sentidos)” (Reis &
Adragão, 1989, p. 21). A capacidade de reflexão do professor sobre a sua própria
prática letiva, a adequação dessa prática às necessidades dos seus alunos, a
avaliação que faz das suas próprias necessidades de formação contínua, serão o
que fará a diferença entre levar os alunos ao sucesso ou ao insucesso. Para além disso, competências como a da leitura, exemplificada na seguinte cena do filme O Substituto, de 2011, ajudam a desenvolver o espírito crítico e autonomia, competências transversais a todo o currículo e mesmo à formação dos alunos como cidadãos.
Para terminar,
convém sublinhar que a liberdade do professor será sempre limitada: Reis e
Adragão (1989, p. 18) referem que é “tarefa primordial do professor a atenção
constante ao programa proposto pelo Ministério da Educação”, ao que se poderia
acrescentar que, no presente, o professor deve não só prestar atenção ao
programa como levar os alunos a cumprir as Metas Curriculares. No entanto, se a
liberdade do professor é limitada, este não deixa de ter uma certa liberdade. É
no parcimonioso uso da mesma que reside a sua função, é assim que poderá chegar
aos alunos, às suas necessidades, às suas aspirações, ao seu sucesso.
Para concluir esta reflexão, parece pertinente referir o vídeo
seguinte, no qual se faz a apresentação do estudo "Literatura e ensino do
Português", seguido de um debate sobre a questão da importância do texto literário no ensino da língua materna.
Bibliografia
Buescu, H. C., Morais, J., Rocha, M. R.,
& Magalhães, V. F. (2015) Programa
e metas curriculares de português do ensino básico. Lisboa: Ministério da
Educação e Ciência.
Ministério da Educação, Departamento da
Educação Básica - DEB - (2001). Currículo Nacional do Ensino Básico –
competências essenciais. Lisboa: Ministério da Educação.
Reis, C., & Adragão, J. (1989). Didáctica do Português. Lisboa: Universidade
Aberta.
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